Essa crônica foi escrita para se contrapor a uma declaração do então presidente Lula, que afirmou que não havia ninguém mais ético do que ele, nesse país! Sério, ele disse isso.
Ética espartana
- Venha aqui, você precisa escutar essa. Era a mulher, que me chamava
para ouvir o nosso Presidente na tevê. Ela sabe que eu não suporto vê-lo. Nem
ouvi-lo, para falar a verdade.
- Nunca, antes na história desse país, a coisa pública foi maltratada com
tanta ética – dizia o nosso bouquirrouco presidente.
- Era só isso – disse eu impaciente. – Não, tem mais – disse ela. Com o
nosso desdigitado presidente, sempre tem mais.
- No Brasil todos são inocentes mesmo com prova em contrário. Os únicos
inocentes propriamente ditos são os meus eleitores, que, na intimidade com a
galega, eu chamo de inocentes úteis.
Não, ele não disse isso. É que, depois de tanto tempo observando a
política dessa terra, fiquei extremamente versado em politiquês. À medida que
vou escutando, o meu cérebro já processa diretamente a tradução.
Gostaria de aduzir algumas obtemperações à fala do trono. Aliás, depois
que a biblioteca presidencial pegou fogo, eu só uso esse português rebarbativo
em minhas crônicas. Ele que se vire para me entender. A biblioteca era uma das sete maravilhas do
mundo moderno. Nunca, antes na história da humanidade, houve uma biblioteca
menor. Mesmo assim pegou fogo. A de Alexandria pegou, com seus milhares de pergaminhos,
por que os dois livros (um de colorir e uma história em quadrinhos) não pegariam?
Não existe ninguém mais ético que ninguém, meu presidente. A lei, como
Vossa Excelência não sabe, é um sistema coercitivo que é imposto pela sociedade
aos seus membros. A ética, ao contrário, é um sistema moral que é adotado
espontaneamente. Existe sim, alguém que rouba mais que os outros. Esse é um
critério objetivo: os valores são traduzíveis em moeda escorrente; as penas,
que não serão cumpridas em celas especiais, podem ser comparadas.
Ia até me aprofundar nessas considerações, quando me veio uma revelação.
O nosso presidente é muito mais ético do que eu. Ocorre que ele escolheu a
ética espartana.
Explico. Em Esparta, para reforçar as virtudes militares, os jovens eram
largados meio famintos no planalto, ou mesmo na esplanada. Tinham que
sobreviver com o que conseguiam roubar. Tudo isso dentro da mais perfeita
ética. Havia, porém, um detalhe: aquele que fosse pego roubando era considerado
um canalha da pior espécie.
Conta a lenda, que um jovem espartano roubou uma raposa. O dono quase o
surpreendeu e ele foi obrigado a escondê-la dentro da túnica. O animal começou
a devorar os seus intestinos, mas ele
preferiu essa morte dolorosa à desonra.
Aqui no Brasil, os petistas famintos também foram abandonados nos cargos
de primeiro e segundo escalão, para testar as suas virtudes militantes. Em
algumas dessas repartições, só sobrou mesmo a raposa no galinheiro. O problema
é que, quando um deles resolveu guardá-la na cueca, o berro foi ouvido até na Praça Vermelha.
Os espartanos tinham outras virtudes. Foram eles, comandados pelo Rei
Leônidas, que detiveram os persas, uma espécie de tucanos da época. Aliás,
sempre que alguém denuncia os crimes petistas (porque eles são espartanamente
éticos) é chamado pejorativamente de tucano. Embora, para todos os malfeitos
práticos, os persas e os espartanos sejam muito parecidos, o nosso povo
continua confiando no nosso presidente. Para eles, tudo isso é grego.
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