Escrito nos raros momentos de folga de uma jornada fatigante.

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Divulgação literária e outros babados fortes

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sexta-feira, 1 de junho de 2012

2012 - O início do fim


Onde se conta como o mundo acabou. As profecias maias estavam erradas e a culpa não foi de Nabiru - todos os méritos foram de nossa presidente, Dona Vilma.


O fim do mundo

O mundo acabou em 2012. Ou pelo menos a civilização ocidental e cristã, tal como a conhecemos. Foi como um tsunami: três ondas consecutivas, sendo a terceira a mais destrutiva. Primeiro a quebradeira, depois a recessão e, no fim, a hiper-mega-inflação.
A primeira não foi surpresa. Banqueiros e grandes investidores há muito sabiam que a economia estava rodando em falso. A moeda fiduciária é sustentada pela fé. Ou na falta desta, pela convicção de que as coisas só devem mudar se houver algo melhor para colocar em seu lugar. Enquanto ninguém conseguia conceber um mundo em que o General Grant fosse apenas um herói da guerra civil, o dólar mantinha o seu livre curso.
A primeira onda passou e deixou um rombo de centenas de bilhões nas carteiras dos bancos. Alguns afundaram. A economia mundial, embora atingida na linha d’água, continuou flutuando. Como o Patna: sem rumo e com os motores apagados. A escassez de dinheiro, além de deixar o fundo à mostra, antecipou a segunda onda, a recessão.
Quando a segunda onda começou a refluir, as pessoas estavam saturadas de previsões sobre a economia. No noticiário, a crise havia submergido, afogada pelo economês. Nas páginas de variedades, embalados pelas profecias maias, pelas centúrias de Nostradamus, ou por algum profeta mais recente, os filhos da Era de Aquarius apontavam para os céus. A besta se aproximava e o seu nome era Nabiru, o planeta das profecias babilônicas.
2012 chegou. O campo magnético da Terra se manteve invariável. Os planetas continuaram em suas órbitas e, se alguém pudesse ouvir as estrelas, escutaria a harmonia perfeitas das esferas. O perigo estava aqui.
A terceira onda se propagou com a velocidade da Internet. Era uma segunda feira cinzenta em Nova Iorque quando o mundo ficou sabendo que a Presidente do Brasil havia feito um importante discurso na ONU. Ms. Vilma anunciou que o Brasil estava pagando toda a sua dívida externa em dólar. Daí em diante, o Banco Central manteria as reservas restantes em yuans e a moeda americana não seria mais utilizada em transações comerciais.
Com a queda instantânea do dólar em todos os mercados, houve uma corrida. Quem podia liquidou suas dívidas, a cada hora com um dólar mais barato, que os governos compravam emitindo papéis. No fim do dia, os Estados Unidos estavam inundados de dólares escriturais e o resto do mundo por títulos da dívida pública e cédulas sem valor, com a tinta ainda fresca. O estrago foi o de várias manadas de elefantes estourando no meio de uma loja de louças chinesas. Não houve tempo para os economistas esboçarem uma teoria para o apocalipse.
            Os historiadores que sobreviveram tampouco conseguiram justificar a decisão da Presidente. Era um consenso, à direita e à esquerda, que o seu mandato era uma continuação do anterior. Dona Vilma deveria se limitar a pequenas correções de rota. Ao entregar a faixa, o seu antecessor usara uma de suas típicas metáforas: a economia brasileira está surfando na marola da crise.  No entanto, ela acabara de virar o barco com golpe brusco no leme.
            Explicar o fim do mundo através de uma crise psicótica estava abaixo da dignidade de qualquer historiador. Mesmo considerando que a História não existia mais e que os últimos profissionais disputavam o lixo acumulado nas ruas com os poetas, músicos, jornalistas, atores de teatro e antigos catadores. Se mal havia dinheiro para pagar os lixeiros, com muito mais razão não haveria para ocupações menos produtivas e socialmente desnecessárias. 
            A China foi arrastada na correnteza e afundou ao peso de seus bilhões de títulos do governo americano. Quando chegou à margem, a única riqueza que se salvara fora a sua força de trabalho. 700 milhões de braços acostumados a trabalhar duro por muito pouco. O Brasil perdeu seus bancos nas primeiras horas. Um pouco antes, o governo fora obrigado a honrar seus títulos colocados no mercado. Em compensação, o dinheiro escritural dos bancos ficou retido como depósito compulsório. A guerra virtual terminou sem vencedores, sem exércitos e sem munição.
De real mesmo, só os poucos depósitos que puderam ser sacados. Não havia mais preços, porque os lojistas sabiam que não haveria mais estoques para repor as mercadorias. Não havia mais emprego, porque não haveria como pagar os salários. Depois de uma inflação de aproximadamente 500% ao dia, acabaram as estatísticas. O escambo começou imediatamente. A única moeda de curso universal eram os cigarros. Os pouquíssimos fumantes que haviam estocado pacotes de cigarro ficaram milionários da noite para o dia.
Um ônibus de sacoleiros que voltava do Paraguai carregado de cigarros foi saqueado pela Polícia Rodoviária, que foi emboscada em seguida pelos traficantes. A droga que eles vendiam agora estava sendo usada para pagar novos recrutas. Os chefes rivais passaram a disputar o saque dos supermercados. A polícia se tornou um novo bando. Ela criou uma milícia que, ao lado do exército, tentava impor a lei marcial e o toque de recolher. O caos durou uma semana.

A continuar. Não percam! Neste mesmo blog, qualquer dia, ou mesmo antes.

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