Escrito nos raros momentos de folga de uma jornada fatigante.

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Divulgação literária e outros babados fortes

Versos cretinos, crônicas escrotas e contos requentados. O resto é pura prosa.

domingo, 3 de junho de 2012

2012 - O início do fim II


Onde se explica a singularidade brasileira através de um modelo físico. Graças à ela, qualquer tsunami vira uma marola.

       A melhor explicação para o fim da crise veio de um físico.  O futuro ministro Oliveira, enquanto matava o tempo ocioso na repartição, havia elaborado um modelo para explicar a singularidade brasileira. Sua teoria, em pouquíssimas palavras, podia ser exposta assim: O Brasil é um sistema perfeitamente inelástico.
Um sistema elástico, quando perturbado, utiliza a energia recebida para oscilar em torno de uma posição de equilíbrio. Como vivemos no mundo sublunar, onde reina a corrupção, o atrito impede que esse movimento se eternize. Um pêndulo, quando solto, oscila durante certo tempo e finalmente para. Um sistema inelástico absorve toda a energia recebida e volta rapidamente à posição de equilíbrio. Um exemplo clássico é o amortecedor de um carro. Sua mola tem uma massa e uma constante elástica tais que o carro passa em cima dos buracos sem trepidar.
A economia brasileira já havia experimentado choques mais violentos do que os causados pelas crateras de nossas estradas e sempre voltava rapidamente a uma posição de equilíbrio. Há um exemplo clássico: um dos apoiadores da nova presidente, quando ocupara o cargo, havia feito um gigantesco confisco.
Pais de família, que haviam economizado a vida toda para comprar uma casa, doentes que estavam poupando o dinheiro da operação, pequenos empresários que aplicavam o dinheiro do pagamento de seus funcionários, todos ficaram a ver navios. O bom senso indicava que o país não duraria uma semana. Previam-se rebeliões, saques, fábricas fechadas, o comércio parado e assim por diante. Nada disso aconteceu. O Presidente ainda governou um bom tempo, com apoio popular, até que um escândalo de família provocou o seu impeachment.
Na verdade, o enunciado forte da singularidade brasileira não se refere apenas à economia - ele abrange todos os aspectos da nossa vida social. A corrupção é um bom exemplo. Freqüentemente são mostrados flagrantes de envelopes passando para as mãos de funcionários, notas na cueca, montanhas e montanhas de dinheiro sem origem, gravações de conversas, vídeos. Todos os tipos de prova, produzidos pela moderna tecnologia, são servido nas revistas semanais, nos jornais, na televisão, em horário nobre. Vinhetas especiais são criadas para identificar o novo escândalo, que depois de certo tempo some sem deixar traços.
O que o povo brasileiro possui de tão singular? Em seu linguajar chulo, Oliveira, o novo ministro afirmava: “o povo brasileiro é que nem vaca – está cagando e andando. E pastando por cima. E tomando em pé, – acrescentava”.
Algumas características são óbvias: a nossa índole pacífica e cordial, por exemplo - a vocação bovina de que Oliveira falava. Dificilmente algo no Brasil chega às últimas conseqüências, às vias de fato. Somos o país do eufemismo, da hipocrisia. Nós tendemos espontaneamente para a posição de equilíbrio, a natureza da alma brasileira abomina os extremos.
Outra característica nossa é a falta de memória: vivemos sempre no presente e adoramos novidades, não importa se requentadas. Essa inconseqüência natural é muito útil para a estabilidade política. Um escândalo atual sempre abafa o anterior e ninguém se espanta quando inimigos figadais, de repente, passam a serem amigos íntimos.
Uma das qualidades que mais nos distingue é a nossa capacidade de improvisação, de dar um jeitinho, de fazer uma gambiarra. Como não cultuamos nenhum valor ou modelo passado, sempre encaramos cada problema como um novo desafio, sem fórmulas prontas. Nós não inventamos a roda, mas somos mestres em fazer o carro pegar no tranco, em fazer uma chupeta. Essa estratégia de contornar, de comer pelas beiradas, de empurrar com a barriga, quando necessário, sem adotar uma solução definitiva, acaba se revelando útil em situações novas e complicadas, que não podem ser resolvidas com as antigas soluções. Um dos nossos anti-heróis, D. João VI, pontificava: ‘se você não sabe o que fazer, não faça nada.”
A Europa é uma prostituta cansada e experiente. A Ásia uma tia velha e reumática. Os Estados Unidos uma adolescente com os hormônios a flor da pele, querendo conquistar o mundo. E nós uma criança de 5 anos. 

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