Setembro
de 1973, eu estava em São Paulo, clandestino. Enquanto isso, minha diretoria da
UNE se dissolvia. Eu havia saído de Porto Alegre, depois de uma série de
prisões. Fui primeiro para Caxias, onde fiquei na casa do Ernesto, velho
militante do PCB.
Um
dos temas, inevitável, de nossas conversas, era a situação do Chile. Minhas
previsões eram pessimistas: o golpe era iminente. Seria uma reedição do golpe
de 64. Mais um na série de golpes militares que assolaram o continente nos anos
70. Ernesto discordava. Segundo ele, eu não confiava na força da classe
operária chilena. Não chegamos a um acordo.
Em São Paulo, ironicamente, eu fiquei numa pensão da Lapa, perto do aparelho do PC do B que seria estourado em 1976. Quando vi as fotos da sala, com o sofá e a mesa de centro, reconheci o local onde havia me reunido com parte do Comitê Central várias vezes, desde 1970.
(Foto da chacina da Lapa, com os corpos de Ângelo Arroyo e Pedro Pomar)
Em São Paulo, ironicamente, eu fiquei numa pensão da Lapa, perto do aparelho do PC do B que seria estourado em 1976. Quando vi as fotos da sala, com o sofá e a mesa de centro, reconheci o local onde havia me reunido com parte do Comitê Central várias vezes, desde 1970.
(Foto da chacina da Lapa, com os corpos de Ângelo Arroyo e Pedro Pomar)
Da
pensão de Dona Pierina guardo algumas lembranças. A dona, uma italiana que
adorava Fernet, muito branca, com a pele macilenta. Um hóspede, negro, que
curtia a novela O Bem Amado, que assistíamos na televisão da sala comum.
Estávamos
em pleno governo Médici, na véspera da ofensiva final contra a Guerrilha do
Araguaia. O PC do B estava sendo exterminado nas cidades. Em dezembro de 72,
caiu o sítio em Jacarepaguá. Onde eu
havia me reunido algumas vezes com Lincoln Oest, Carlos Danielli e Guilhardini,
do Comitê Central. Todos assassinados.
Lembro
vagamente de um militante do Espírito Santo, que participou de uma dessas
reuniões. Era o Foedes, que entregaria o sítio e o partido no seu estado.
Miriam Leitão foi presa, em consequência dessa delação.
O
Bem Amado, de Dias Gomes, era uma parábola sobre o poder. Falava do
coronelismo, mas podia ser lida como uma crítica aos generais. Não me lembro do
nome do meu companheiro de pensão, o negro que curtia a novela. Por um ou outro
comentário, eu percebia que ele ia além de uma leitura imediata da trama.
Um
dia de setembro, pela manhã, veio o golpe. Que assisti em preto e branco, narrado
segundo a versão de Pinochet. Á noite a Junta Militar já havia assumido o
poder. 300 mil pessoas foram presas, 35 mil torturadas, pelo
menos 3 mil assassinadas nos primeiros dias do golpe e mais de 30 mil durante o
regime Pinochet. Lembro de o negro ter comentado que Allende era um
homem bom.
O Bem Amado virou uma série, em 1980. O Chile elegeu e
reelegeu Bachelet, que foi para a clandestinidade, depois do golpe, sendo presa
e exilada. O Brasil saiu do regime militar em 1985. Alguns dos militantes que
participaram dessa luta estão de volta à cadeia. Dessa vez por corrupção. Houve
um outro 11 de setembro, que ofuscou a queda de Allende.
Se a História se repete, é certo, com novos atores e novos enredos, temos que procurar o similar do impeachment de Dilma no impeachment de Collor. Dilma não é Getúlio, muito menos Jango, menos ainda Allende. O PT não é de esquerda e os militares estão nos quartéis (menos na Venezuela).
Se a História se repete, é certo, com novos atores e novos enredos, temos que procurar o similar do impeachment de Dilma no impeachment de Collor. Dilma não é Getúlio, muito menos Jango, menos ainda Allende. O PT não é de esquerda e os militares estão nos quartéis (menos na Venezuela).
Eu também mudei, só não perdi aquela mania de me
apegar à realidade, por mais que ela contrarie os meus desejos.
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