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domingo, 11 de julho de 2010

Dona Dilma e as grandes fortunas

A revista Veja anda na contra-mão da direita moderna. Procurando capitalizar a cagada de Dilma, que, ao registrar sua candidatura, apresentou o programa do PT, ao invés do programa da aliança, ela abraça uma teoria conspiratória -. haveria uma agenda oculta, radical, que seria o verdadeiro programa da Dilma.

Numa ilustração, a revista faz uma lista dessas medidas e inclui a taxação das grandes fortunas. Segundo Veja, essa proposta teria sido apresentada num projeto do senador Paulo Paim, do PT.
Ledo engano. O imposto sobre as grandes fortunas está previsto na Constituição de 88. 
"Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
...
VII - grandes fortunas, nos termos de lei complementar."

Nesse ponto, a Constituição tampouco foi radical. É praxe no primeiro mundo taxar pesadamente as grandes fortunas. Pode-se discutir a repercussão econômica dessa medida, mas seria temerário taxá-la como de esquerda.

Por outro lado, seria interessante saber o que a direita esclarecida e as grandes fortunas pensam sobre a candidata. O textoabaixo foi extraído do Blog da Dilma

Hildegard Angel, Jornal do Brasil

“Ao fim de seu almoço para Dilma Rousseff, cercada pela imprensa por todos os lados, Lily Marinho respondeu ao repórter que lhe perguntou se também fará almoços para os demais candidatos: "Não, só para ela!". Naquele momento, tive a certeza de que Dilma havia conquistado mais um voto. Afinal, em seu pequeno discurso, lido antes da sobremesa, Lily falara da necessidade de "ouvir diretamente os candidatos, sem intermediários para formar opinião sobre a melhor escolha daquele ou daquela que irá conduzir nosso país nos próximos quatro anos". Lily também lembrara o marido, Roberto Marinho, "que jamais se absteve de conviver com as diferenças de opinião". Mas não havia, naquela resposta de Lily ao repórter — "Não, só pra ela!" — qualquer resquício de dúvida, qualquer indecisão diante da escolha certa.

A Rede Globo é um símbolo da direita brasileira. Pega mal para Dilma assumir explicitamente essa aliança. Eu até acho que depois de Collor, Maluf e Sarney não haveria tanto problema assim, mas vá lá se entender a cabeça dos marqueteiros. Por isso, num texto de Luis Nassif, flagramos essa tentativa de dissociar a candidata da Rede Globo.



Dona Lily é personagem de um mundo fantástico do Rio de Janeiro, da fase áurea dos anos 40 quando, ao lado do marido Horácio de Carvalho, do casal Walter Moreira Salles-Helene, Aloisio Salles-Peggy, dominavam os salões da cidade, nos tempos em que Roberto Marinho ainda não tinha chegado ao primeiro time. O primeiro marido Horácio Carvalho foi pessoa influente no governo Dutra e no governo JK. Dono do Diário Carioca - ao lado de José Eduardo Macedo Soares -, e da Erika - editora de revistas -, acabou repassando a empresa para Samuel Wainer, em um episódio que deu muito pano para manga para Carlos Lacerda.
Mesmo com todo esse histórico, dona Lily nunca teve atuação política. Viúva, casou-se com Roberto Marinho, foi companheira dos últimos anos do patriarca, mas jamais teve ingerência em qualquer negócio das Organizações Globo. Nem é mãe de seus filhos. Assim, a importância desse almoço é simbólica: reside em derrubar preconceitos da velha elite carioca contra a candidata do PT.
Então tá. Correu dos braços da Rede Globo para cair nos braços das grandes fortunas. Até que o texto procura glamourizar aquele mundo fantástico - a fase aúrea dos anos 40, com seus salões. A velha elite carioca. Ou a grande burguesia, como diria um velho barbudo ranzinza.

Conheço amigos que assimilaram o governo Lula, mas temem uma suposta radicalidade de sua candidata. Tranquilizem-se. Dona Lily não frequentou em vão os melhores salões do Rio de Janeiro. Ela nunca apoiaria uma candidata que ameaçasse o seu patrimônio. Nesse ponto, além de  ter adquirido um horizonte intelectual mais amplo, ela deve ter absorvido um pouco do tino para negócios de Roberto Marinho, esse novo rico que acabou chegando ao primeiro time.


Um comentário:

  1. O episódio do programa é emblemático, mas não pelas razões que a direita burra supõe. Para mim, ele simboliza o enterro definitivo daquele PT antigo, em que trabalhador não votava em patrão, em que as alianças eram feitas em cima de programas de governo, em que os programas eram debatidos vírgula por vírgula, até a exaustão.
    Hoje a esquerda governista (muito mais governista do que esquerda) sabe muito bem que os programas são uma declaração de intenções, que, em nome da governabilidade, vão ser abandonadas na primeira hora.
    A despreocupação com o conteúdo desse pedaço de papel, nada mais que uma exigência burocrática, explicam muito bem a despreocupação de Dilma. "Eu só rubriquei, não li."
    Noutros tempos, ela daria uma última lida, se preocuparia em saber se a comissão de redação realizou um bom trabalho, talvez até desse uma revisada no português. Pelo menos, daria uma folheada rápida e evitaria pagar esse mico.

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