Escrito nos raros momentos de folga de uma jornada fatigante.

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segunda-feira, 15 de março de 2010

Capítulo 5

Capítulo 5 – A seleção dos militantes

Como vimos inicialmente, Maurício Grabois, Paulo Mendes Rodrigues, Pedro Pomar, Carlos Danielli, Ângelo Arroyo, Gilberto Maria Olímpio e Osvaldo Orlando da Costa, desde os meados da década de sessenta, estavam encarregados do trabalho no campo, que ia desde o levantamento até a implantação numa área. João Carlos Haas Sobrinho, Divino Ferreira de Souza e Michéias Gomes de Almeida, percorreram o Maranhão por mais de um ano e chegaram mesmo a se instalar em Porto Franco.
Miguel Pereira dos Santos (Cazuza), segundo fontes do PC do B, estava desde 1965 na clandestinidade e viveu certo tempo em Praia Chata, ao norte de Goiás, margens do Rio Tocantins. Provavelmente, de lá se deslocou para a área do destacamento C. André Grabois (Zé Carlos), filho de Maurício Grabois, havia feito o curso na China e era muito visado pela repressão. Chegou ao Araguaia em 68.  Daniel Ribeiro Callado (Doca), militava no Partido desde 62 e estava na clandestinidade desde 64. Ele se deslocou para a região em 66. 
Esses militantes formaram o embrião dos três destacamentos, comprando terras na Faveira, às margens do Gameleira e em Caianos. Zé Carlos, Osvaldão e Paulo seriam os comandantes dos destacamentos A, B e C, respectivamente. Arroyo, João Carlos Haas, Grabois e Gilberto foram designados para a Comissão Militar, esse último como guarda. Danielli ficou na cidade, encarregado de selecionar mais militantes para a guerrilha. Amazonas se deslocou para a Faveira em 68. Lá encontrou Líbero Giancarlo Castiglia e Elza Monnerat, que também iriam para a Comissão Militar. Uma das incumbências de Elza era levar os militantes até a área, fazendo constantes deslocamentos até São Paulo.
Podemos dizer que em 68 encerrou-se a primeira fase, com a aprovação definitiva da área, a criação dos núcleos dos futuros destacamentos e o deslocamento de parte da direção para o cenário onde se esperava que começasse a luta no campo. É importante assinalar que, no caso do Araguaia, a prática antecedeu a teoria. O documento “Guerra Popular, o caminho da luta armada no Brasil” foi elaborado nas selvas do Araguaia por Amazonas e Grabois.
A partir de 69 acelera-se o envio de militantes, para a região, inicialmente com o envio de quadros mais experientes e, em 70 e 71, com o envio de militantes mais novos, completando praticamente os efetivos previstos. Dentre estes últimos, predominavam os estudantes, com sérios problemas de repressão nas cidades. A juventude que havia participado dos embates de rua em 68 estava visada e muitos já estavam na clandestinidade.  Como disse Genoino, a sua geração foi “emparedada” pelo AI-5.
O processo compreendia uma pré-seleção, em que alguém da direção regional indicava aos encarregados do Comitê Central um militante com aptidão ou vontade de desenvolver o trabalho no campo. O candidato era sabatinado e, se aprovado, seguia para a região. Pelos depoimentos dos sobreviventes da guerrilha, as entrevistas visavam verificar o nível de comprometimento do militante com a revolução.
O depoimento de Ozeas é esclarecedor:
“Entre 69 e 72 eu dava assistência à Comissão Estudantil e viajava para alguns estados em nome do CC (Comitê Central): Rio Grande do Sul e Bahia. Mantinha contatos sistemáticos com Danielli e Pomar. Viajei ocasionalmente para outros estados, como Paraná e Mato Grosso. Ajudei no aliciamento de militantes para o Araguaia. Os que vinham do Ceará chegaram ao CC por meio de contato comigo. Como eu tinha contato com o partido no Movimento Estudantil em todos os estado onde o PC do B existia, ajudei também por meio desses contatos diretos.
Não sabia onde era a área, mas sabia que estava em preparação, cada vez mais acelerada. Em aparelhos do CC participei de reuniões nas quais estavam presentes pessoas que, evidentemente, estavam na área, como Grabois, Bronca, Paulo Rodrigues, etc. Quando o Araguaia caiu, quem me comunicou foi Danielli. Estava preocupado, ainda que confiante.”[1] Ozeas chama de queda o ataque do exército aos PA.

As rotas de chegada variavam, dependendo se o destino final era Faveira, Gameleira ou Caianos (destacamento A, B ou C, respectivamente). A rota básica era: São Paulo - Anápolis. Daí de ônibus pela Belém-Brasília até Araguaína. De Araguaína uma das rotas era Imperatriz, Araguatins, depois a travessia de balsa e a Transamazônica. Essa rota era usada para chegar ao Destacamento A. Quem ia para o Destacamento B, subia o Araguaia de barco, descendo em Santa Isabel. Para o Destacamento C, a rota passava por Xambioá, atravessando o Araguaia de balsa para São Geraldo.
 Os militantes iam recebendo o dinheiro para as passagens em pontos nas rodoviárias ou em hotéis próximos à mesma. Mais próximo do destino, algum guerrilheiro mais antigo ia buscar o recém-chegado. Ninguém saía sabendo o destino final.
Em relação à escolha dos militantes, muitas críticas são feitas: desde aquelas que culpam o partido por levar militantes para a área, sem saberem que iriam participar de uma guerrilha; até as que apontam falhas gritantes na seleção, com a escolha de pessoas despreparadas. Ultimamente, surgiu a suspeita de que haveria agentes da repressão infiltrados entre o grupo.
Considerando o total dos guerrilheiros, veremos que a maioria lutou bravamente, mesmo nas piores condições, quando já estava claro que não havia a mínima perspectiva  de êxito. É certo que houve deserções, fugas, pessoas que fraquejaram sob a tortura e que passaram a colaborar em maior ou menor grau com os militares, mas a maioria se comportou heroicamente.
Numa situação de grande pressão, é normal que o militante procure demonstrar uma firmeza que às vezes não possui. Nas entrevistas, isso poderia dar uma falsa idéia da sua disposição. Sob as circunstâncias da época, era compreensível que fossem cometidos erro nas avaliações dos futuros guerrilheiros.
Embora houvesse um grande empenho em levar para a área os quadros requisitados, muitos foram recusados para a tarefa por problemas de saúde, por o Partido ter julgado que seriam mais úteis na cidade, ou por outras razões. A grande maioria dos que foram era perseguida pela repressão. Muitos já haviam passado por prisões e torturas e sabiam muito bem que a luta contra o regime era uma luta de vida ou morte.
 Ficar na cidade não era uma garantia de que não seria morto. Helenira, diretora da UNE, morreu no Araguaia. Honestino, presidente da diretoria seguinte, foi preso na cidade e assassinado. Por uma trágica coincidência, surgiu a versão de que ele teria sido levado para a região da guerrilha e lá executado. [2] Nem mesmo os militantes daqueles partidos que recusaram a via armada, como é o caso do PCB, escaparam. Parte de sua direção e alguns militantes foram assassinados sob tortura.
Finalmente, sobre a existência de agentes infiltrados na guerrilha é preciso ser muito cauteloso. O Cabo Anselmo não é uma figura isolada. Personagens assim sempre aparecem em momentos de grande agitação política e social. Também é verdade que a provocação é uma prática comum nos organismos policiais. No caso do Araguaia, principalmente a partir da terceira campanha, quando a ordem era de não deixar sobreviventes, é fácil para a repressão forjar documentos e montar acusações falsas.
Para os que perderam parentes e amigos no Araguaia, é doloroso, sem dúvida, tomar conhecimento das circunstâncias de suas mortes. Há uma tendência a responsabilizar os dirigentes por terem levados jovens inexperientes a uma jornada sem retorno. Em nossa opinião, há um único culpado: o regime fascista. Consideramos que foi uma escolha voluntária e consciente - se optaram pela melhor maneira de lutar, é uma questão que exige uma ampla perspectiva histórica para ser elucidada.
A duração da luta, as baixas sofridas pelo exército e a quantidade de recursos mobilizados são prova de que o Araguaia foi a tentativa que mais ameaçou o regime militar. Entre a procura do local e o fim da guerrilha transcorreram dez anos (64 a 74). Não foi um ato impensado ou inconseqüente (o que não quer dizer que não possa ter sido equivocado).
Em pelo menos um caso, a alegação de que estava indo para o Araguaia sem saber que tipo de tarefa iria assumir, é aceitável. Tereza, mulher de Pedro Albuquerque, começou a militar no movimento estudantil pelo PCBR[3], quando estudava sociologia em Recife. Presa, em 1971, fugiu para a Fortaleza. Lá rompeu com o PCBR, ingressou no PC do B, conheceu Pedro, casaram-se e chegou ao Araguaia, tudo isso nesse mesmo ano.
Segundo Pedro:
“No mesmo dia em que chegamos no campo, foi dito que estávamos em um campo de guerrilha. Teresa imediatamente disse que ali não ficaria, que não sabia que tinha ido para aquilo. Ela tinha pouco tempo de partido, diferentemente de mim, tão ligado ao PC do B que não importaria em dar minha vida naquelas circunstâncias, mas a gravidez nos forçou a uma decisão grave, a de abandonar a guerrilha. Eu não sabia que estava indo para a guerrilha. O que o partido decidisse, eu faria, mas eu achava que íamos fazer um movimento de massa. Estive com o João Amazonas e aceitaria qualquer decisão, ir para onde ele fosse. Mas, eu não sabia. O camarada Zé Duarte (dirigente) afirmou eu ia cumprir uma missão importante para o partido, que eu ia sem a Teresa, mas resolveu mandar nós dois. Foi um equívoco. Teresa tinha muito pouco tempo de partido. Trabalhava na organização do PC do B em Pernambuco e na Paraíba”. [4]
Na mesma entrevista, Teresa afirma:
“A minha idéia de mudar o mundo era através da educação, porque eu era educadora. O partido deu a entender que a gente ia para o interior e eu iria ser professora, trabalhar com as mulheres, a organização, tanto que eu fiquei como professora lá”.
            É de se ressaltar que o PCBR defendia a luta armada e que, mesmo com pouco tempo de militância, Teresa deveria saber que essa também era a opção do PC do B.



[1] Depoimento prestado ao autor, através de e-mail.
[2] Sem vestígios. Morais, Taís.
[3] Partido Comunista Brasileiro Revolucionário. Umas das dissidências do PCB após 64 que optaram pela luta armada.
[4] Entrevista de 30.07.2007

2 comentários:

  1. vc gosta mesmo de Ficção científica ne GATO... CRIMERDA guerrilheira so se for por INDENIZAçao, a CRIMERDA meditando ong...ong...ong...

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  2. Criméia incomoda hoje em dia, não pelo fato de ter sido guerrilheira e sim por desmascarar os falsos brilhante, né ustrinha?

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