O gol
Essa é a história de um velho que vive em um apartamento com um gato. Ele está sentado numa poltrona, com um pedaço de papel na mão. Algo muito importante, algo que ele não pode esquecer, está escrito nesse papel. O velho confere a hora no relógio.
Toca a campainha.
Ele sabe que é uma coisa importante,
uma coisa que ele não pode esquecer. Olha para o papel e, quando ia se lembrar
de levantar da poltrona, lembra-se do gol.
O estádio está cheio e o jogo
empatado. Está sozinho, bem aberto pela ponta. O armador lança a bola, que
domina com classe. Imediatamente vê a defesa fechando sobre ele.
Toca de novo a campainha.
Não se lembra como, mas já está de
cara para o gol, com dois zagueiros pela frente e o lateral correndo ao seu
lado.
E, inevitavelmente, toca a campainha.
Ele só pensa no gol. O goleiro surge
à sua frente, fechando o ângulo. Bate embaixo da bola, que o encobre, faz a
curva perfeita e vai caindo, caindo...
Inexoravelmente, toca a campainha.
A bola bate na trave, cai sobre a
linha, toma o efeito contrário e entra.
Gol.
A torcida enlouquece. É o gol do
campeonato. Beija o escudo do Nacional e corre para abraçar os companheiros.
Olha para o relógio.
O relógio está errado. Marca uma hora
que ele não consegue ler. O gato o atormenta o tempo todo, não quer que ele se
esqueça de nada. Quando isso acontece, o gato adianta o relógio. Agora o gato
estragou o relógio.
A campainha não toca mais.
Olha para o pedaço de papel, onde
está escrito uma coisa que ele não pode esquecer. O papel está errado, rabiscado
com uma letra que ele não consegue entender. O gato estragou o papel.
Mas o gato não sabe que ele se lembra
do gol. Isso ele não esquece.
Uma história aparentemente trivial, salvo pelo imponderável - ele nunca foi jogador.
Uma história aparentemente trivial, salvo pelo imponderável - ele nunca foi jogador.
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