Esta situação foi sensivelmente alterada com o fechamento do Partido (1947), a cassação dos mandatos parlamentares (1948) e o acirramento da guerra fria no final da década de 1940 e início da década de 1950. A política cultural do PCB se tornou cada vez mais estreita e sectária. O crescimento do sectarismo no campo cultural no Brasil coincidiu com o amplo predomínio das idéias de Jdanov na política cultural soviética. Tivemos, então, o afastamento gradual de inúmeros intelectuais e artistas brasileiros do campo de influência comunista. Entre eles estavam Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Érico Veríssimo, Otto Maria Carpeaux. Àlvaro Lins, Alceu Amoroso Lima.
Um dos momentos mais dramáticos do processo de cisão da intelectualidade brasileira ocorreu durante a eleição da Associação Brasileira de Escritores, ocorrida em março de 1949. Surgiram, pela primeira vez, duas chapas: uma apoiada pelos comunistas e outra pelos setores liberais-democráticos. Da chapa de oposição liberal participavam Carlos Drummond de Andrade, Manuel Bandeira, Afonso Arinos de Melo Franco, Otto Maria Carpeaux entre outros – a grande parte deles havia assinado o manifesto de 1947 e apoiado os candidatos comunistas. Os intelectuais chegaram a entrar em confronto físico pela ata da reunião. O próprio Carlos Drummond de Andrade foi agredido. Os comunistas ganharam a eleição, mas a organização se esvaziou, perdeu seu caráter unitário – de frente única cultural – e toda importância que teve nos anos anteriores.
Intelectuais paulistas não comunistas, como Antônio Cândido e Sérgio Milliet, passaram a ser taxados pela revista Fundamentos de “escória cultural da terra, em que pontificam tarados, renegados, lumpens e até mesmo alguns retardados mentais”. Um artigo emblemático desta fase foi o de Osvaldo Peralva, intitulado “Os intelectuais que traíram o povo”, publicado na revista Paratodos. Sobre Carlos Drummond ele afirmou: “anticomunista raivoso, para quem a lealdade jamais constituiu uma pedra no meio do caminho”. O crítico comunista Emílio Carréra Guerra, referindo-se ao grande poeta, escreveu: “Essa doença que lhes faz ver tudo negro, num mundo de problemas e contradições sem saída, é próprio de sua gente, da classe podre, arcaica, degenerada e moribunda”.
Magoado com a atitude dos comunistas afirmou o poeta Manuel Bandeira: “Houve um tempo em que vi com bons olhos os nossos comunistas (...) O episódio da ABDE me abriu os olhos. Hoje sou insultado por eles ao mesmo tempo em que sou tido como comunista por muita gente”. Drummond escreveu em seu diário: “eles pouco entendiam o nosso ponto de vista (...) A idéia de uma associação de escritores livres, sem direção sectária, parece inconcebível para eles, que, em vez de convivência pacífica, preferem assumir o domínio pleno da organização”. A crise se agravou ainda mais em 1956, quando no XX° Congresso do PCUS Krushov apresentou seu relatório secreto denunciando os crimes de Stálin. Este teve um impacto devastador sobre parcelas da intelectualidade partidária. O próprio Jorge Amado escreveu no jornal Imprensa Popular: “Sinto a lama e o sangue em torno de mim”. Vários intelectuais abandonaram o Partido ou foram afastados.